domingo, julho 22, 2007

Rejeição


"Não sei o que tem meu primo
que não me olha de frente.
Se passo por sua porta,
é como se não me visse:
parece que está na Espanha
e eu, velhamente, em Minas.
Até me virando a cara,
a cara é de zombaria.
Se ele pensa que é mais forte
e que pode me bater,
diga logo, vamos ver
o que a tapa se resolve.
A gente briga no beco,
longe dos pais e dos tios,
mas briga de decidir
essa implicância calada.
Qual dos dois, mais importante:
o ramo dele, o meu ramo?
O pai mais rico, quem tem?
Qual o mais inteligente,
eu ou ele, lá na escola?
Namorada mais jeitosa,
é a minha ou é a dele?
Tudo isso liquidaremos
a pescoção, calçapé,
um dia desses, na certa.
Sem motivo, sem aviso,
meu primo declara guerra,
essa guerrinha escondida,
de mim, mais ninguém, sabida.
Pode pois uma família
ser assim tão complicada
que nós dois nos detestamos
por sermos do mesmo sangue?
Nossas paredes internas
são forradas de aversão?
Será que o que eu penso dele
ele é que pensa de mim
e me olha atravessado
porque vê na minha cara
o vinco de zombaria
e um sentimento de força,
vontade de bater nele?
Meu Deus, serei o meu primo,
e a mesma coisa sentimos
como se a sentisse o outro?"

(Drummond)
Obra de Camile Bombois

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