quinta-feira, julho 12, 2007

O DROMEDÁRIO

Era uma vez um jovem dromedário que não estava muito bem disposto. No dia anterior tinha dito aos amigos: Amanhã vou sair com o meu pai e a minha mãe, vamos ouvir uma conferência, imaginem! E os outros tinham dito: Ah, vai ouvir uma conferência, que maravilha! E durante toda a noite, não tinha conseguido dormir nada, tal era a impaciência dele, mas afinal começava a ficar mal disposto, porque a conferência não era nada do que ele tinha pensado: não havia música, era uma decepção, estava aborrecidíssimo, apetecia-lhe chorar.

Havia uma hora e três quartos que o senhor gordo estava a falar. Na frente do tal senhor estava um jarro de água e um copo de dentes sem escova e o senhor, de vez em quando, deitava água no copo, não lavava os dentes, e, visivelmente irritado, falava de outras coisas, ou seja de dromedários e de camelos.
De cinco em cinco minutos o conferencista repetia: É importante não confundir os dromedários com os camelos, chamo a vossa atenção, minhas senhoras, meus senhores e meus caros dromedários para o facto seguinte: o camelo tem duas bossas, enquanto o dromedário só tem uma!

E o conferencista continuava: A diferença entre os dois animais é esta: o dromedário tem uma única bossa, enquanto, coisa estranha mas que é útil saber, o camelo tem duas...

Todas as pessoas que havia na sala repetiam: Interessante, interessantíssimo! e todos os camelos, dromedários, homens, mulheres e crianças tomavam notas num caderninho.

O jovem dromedário já não suportava o calor e a bossa também o incomodava muito; roçava-lhe no encosto da cadeira; estava muito mal sentado; não conseguia estar quieto.

Aí a mãe dizia-lhe: Está sossegado, deixa o senhor falar e dava-lhe beliscões na bossa. A única vontade do jovem dromedário era chorar e ir-se embora.

Até que o jovem dromedário se fartou e, correndo para o estrado mordeu o conferencista. Camelo!
- disse o conferencista, irritadíssimo.

E a assistência começou toda a gritar: Camelo! Sua porcaria de camelo! Mas era mentira, porque ele era um dromedário impecável.

O dromedário é um animal geralmente pacífico, mas não suporta os conferencistas faladores: sobe-lhe logo o sangue à bossa.

(TEXTO DE JACQUES PRÉVERT)

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